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Por trás da Letra de Natália (Legião Urbana).

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 O Literatura do Guimarães sempre se mostrou um blog "legionário". Legião Urbana já chegou a ser homenageada com dois textos em homenagem a Renato Russo, uma crítica de sua biografia e dois artigos sobre os filmes Faroeste Caboclo e Somos Tão Jovens, um deles inspirado em uma música e outra na vida do líder da banda.
 Ou seja, Legião Urbana não é novidade por aqui. Não demoraria muito para que logo a letra de alguma de suas canções (muito mais poéticas do que técnicas) fosse analisada e interpretada por aqui.
 Escolhida então foi Natália, primeira faixa do álbum Tempestade (lançado em 1996, mesmo ano do óbito de Renato Russo) que retrata bem a depressão que o trovador solitário sentia, sua ânsia por esperança e seu descontentamento com o pessimismo.



 Vamos falar de pesticidas
e de tragédias radioativas,
de doenças incuráveis,
vamos falar de sua vida.

 A canção é dirigida a alguém. Esse alguém, supostamente, seria Natália.
 Na conversa entre os dois (digamos que Renato Russo é o emissor e Natália o receptor), os assuntos são inúmeros. O mundo possui problemas graves, de alta importância. Situações que devastam povos, provocam desastres e até mesmo enfermidades intratáveis.
 Tantos assuntos a serem tratados, e mesmo assim Natália insiste em só falar de si mesma, de seus dramas. Como se suas aflições fossem tão graves quanto pesticidas, tragédias radioativas ou doenças incuráveis.

 Preste atenção ao que eles dizem.
 Ter esperança é hipocrisia.
 A felicidade é uma mentira.
 E a mentira é a salvação.

 Renato aponta um dos maiores motivos que faz Natália enxergar sua vida de modo tão negativo - As pessoas em volta. Enquanto enfrenta complicações naturais para qualquer pessoa, a garota as vê como problemas cada vez mais assustadores e monstruosos devido ao modo como o povo enobrece os males com pessimismo e pensamentos negativos.

 Beba desse sangue imundo.
 E você conseguirá dinheiro.
 E quando o circo pega fogo,
somos os animais na jaula.

 O único jeito de sobreviver a sociedade que a empurra contra o tormento e que esfrega as aflições em sua cara é se tornando um sócio dessa "equipe pessimista". Assim, obterá sucesso e paz de espírito justamente por ser igual a todos os outros.
 Mas há um problema. Ao desabar e criar um escândalo com qualquer problema básico e simples, se perde o controle para resolver qualquer tipo de problema. E quando surge algo realmente importante, "somos os animais na jaula".
 Animais por estarem sem controle e sem a capacidade de pensar no que fazer. E na jaula por estarem limitados por coisas que os prendem e imobilizam em um único lugar, como o medo e a falta de esperança.

 Mas você só quer algodão doce.
 Não confunda ética com éter.
 Quando pense em você eu tenho febre.

 Renato finalmente diz o que pensa e sente a respeito de pessoas como Natália. Ela só quer algodão doce, só quer do bom e do melhor, quer a comida mastigadas, não quer nem as complicações ínfimas. Apenas algodão doce, apenas o que for fácil e indolor.
 E como nada é algodão doce, ela busca conforto nas drogas. Mas Renato avisa: O que ela precisa é ética, e não éter ou qualquer outra droga.
 Natália chegou a um nível de mimimi e draminha que faz com que Renato se deprima apenas ao pensar nela.

 Mas quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você.
 Quem sabe um dia escrevo uma canção pra você.

 Há sempre a possibilidade da mudança. Se Natália mudar, se ela lembrar e ver que o caminho é um só, se ela se recuperar e enxergar que a vida é um mar de rosas com alguns espinhos...talvez ela ganhe uma canção só dela. Talvez ela mereça.

  É complicado estar só.
 Quem está sozinho que o diga.
 Quando a tristeza é sempre o ponto de partida.
 Quando tudo é solidão.

 Problemas são reais. Eles existem, eles realmente assolam o coração das pessoas. Mas não o de Natália. Natália não tem problemas, apenas um. O problema da dramatização. Quando começa a pensar em algo ou a sentir algo, sempre foca no que pode dar errado. Sempre parte do princípio da tristeza ou de que tudo dará errado.
 E isso é realmente o que torna a vida de Natália um problema.

 É preciso acreditar num novo dia.
 Na nossa grande geração perdida.
 Nos meninos e meninas.
 Nos trevos de quatro folhas. 

 Renato, enfim, oferece uma solução. Haja fé. Haja esperança.
 É fato que estamos em maus lençóis, mas isso não deve nos desanimar. Natália precisa saber que mesmo com um presente terrível,o futuro ainda pode ser bom. Com o amanhã que está por vir, com a geração perdida que pode ser salva pela esperança, com as nossas crianças que crescerão e poderão melhorar o mundo.
 A sorte pode sorrir pra nós, é só termos na cabeça (e no coração) de que "o sol vai voltar amanhã".

 A escuridão ainda é pior do que a luz cinza.
 Mas estamos vivos ainda.

 A única coisa pior do que o "pouco", é o "nada". Mesmo que tudo pareça ruim, não está acabado. Ainda estamos vivos e podemos fazer com que tudo mude.
 Natália ainda tem algo pelo qual lutar. A vida e a qualidade da mesma.
 E isso está longe de ser perdido.

  E quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você.
 Quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você.
 Quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você.
 Quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você. 
 Quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você.
 Quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você.
 Quem sabe um dia eu escrevo uma canção pra você.

 Todo ser humano é especial, e todo ser humano será feliz se saber como viver.
 A filosofia "pregada" pela Legião Urbana sempre foi a de que, apesar dos pesares, a vida é bela e vale a pena.
 Todos são especiais. Tanto os pessimistas quanto os realistas.
 Natália sendo um tipo de pessoa ou outro, "eu acabei escrevendo uma canção pra você".
 Pois o sol nasce pra todos, e só não sabe quem não quer.


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